28 de fevereiro de 2016

Velho...

No passado dia oito de Setembro, aí pelas três da tarde, fui oficialmente declarado velho. Desde esse dia até hoje tenho vindo a tentar perceber a epistemologia deste novo estatuto e verifiquei, um pouco surpreso, que esse estatuto não me contemplou com qualquer benefício notório ou regalia de casta.
Reparei que as notícias dizem normalmente coisas como esta:  “morreram, (ou foram  sequestrados, ou ficaram enterrados na neve ou foram levados por uma enchente, enfim, a tragédia é absolutamente indiferente) três homens, seis mulheres e quatro velhos”, ou, no actualíssimo dizer politicamente correcto, "seis mulheres, três homens e quatro velhos". Isto quer dizer que o estatuto de velho não acumula com o de homem, antes o exclui liminarmente. O mesmo acontece, portanto, ao estatuto do homem, que não acumula com o de velho e exclui este conceito, embora não por tanto tempo quanto seria desejável, para tristeza dos homens e vingança dos velhos...

Sabendo que não sou mais um homem, mas apenas um velho, intrigou-me saber que competências de homem estão definitivamente negadas ou proibidas ao velho, para que este não possa mais ser considerado homem. 
Ah, o velho não é mais homem porque não pode trabalhar. Nada contra. Com um pouco de boa vontade, considero isso um privilégio. Mas há velhos que trabalham, são os chamados velhos pobres.  E isso reclama, naturalmente, que eu procure outras competências desaparecidas do homem que se é até aos sessenta e cinco anos, e que deixa de se ser a partir dessa idade.
E foi aí que tropecei no sexo. É claro. Homem pode fazer isso com alguma facilidade. O velho, não.  Mesmo um velho novo como eu (na verdade só tenho alguns meses de velho, sendo portanto um velho bebé, um caloiro da velhice) experimenta enormes dificuldades quer em fazê-lo, quer em não o fazer. E prova dificuldades acrescidos quer em assumir que o faz, quer em assumir que o não faz. A verdadeira diferença, nesta matéria, entre o velho e o adolescente é que o velho tem consciência do que lhe está a acontecer e o adolescente ainda não.
Dada a minha perceptível inexperiência como velho, fui ontem mesmo consultar um velho mais velho do que eu, um velho de 80 anos, o Senhor Armandino, que se refastelava no Arcada, diante de um café abagaçado. “Está claro que tu és um puto”- atirou ele. “Estás baralhado e confuso. É natural. Eu te digo: ser velho traz muitas limitações. Nunca sabemos o que podemos comer e, sobretudo, quem podemos comer”.   
Aí está o verdadeiro estatuto do velho: ainda temos apetite, mas não temos acesso a pratos suculentos.  “Só para homens” – diz o cardápio…