Dez mil e duzentos professores foram fazer a prova. Destes, mil e setecentos foram reprovados. Não sabemos se estão entre os reprovados os professores que deram mais de 4 erros ortográficos num texto de trezentas palavras (a estatística refere mais de cinco, mas assume que dez por cento dos erros ortográficos cometidos se devem ao acordo ortográfico. Vamos pois, descontar um erro). Foram quinze por cento os professores nestas circunstâncias, ou seja, mil quinhentos e trinta e três professores, que representam 0,01 por cento da totalidade dos docentes na carreira. Não me parece significativo.
Claro que esses 0,01 por cento podem ter calhado ao seu filho e daí os duzentos erros ortográficos que ele dá num texto de 300 palavras… Meu caríssimo Encarregado de Educação, saiba que nem tudo pode ser perfeito e se você quiser um professor realmente competente, como um Nuno Crato ou mesmo um Ricardo Salgado terá que o pagar bem caro e saiba que não estão para se cansar a dar aulas. Não é provável que o encontre no Sistema Público de Educação, pois aí só há mesmo é burros de carga, animais incompatível com uma educação para a liderança. É isso mesmo, os professores de excelência custam um balúrdio e não estão disponíveis para coisa nenhuma.
O pior cenário da PACC, mais de 4 erros ortográficos num texto de 300 palavras, manifesta-se assim absolutamente razoável, a menos que o máximo atinja números tais como 100 ou 200 erros, facto que não é referido na análise, nem me parece muito provável. Do discurso analítico em relação a este item do dislate ortográfico ressalta que, na pior das hipóteses, aqueles 15 por cento dos professores presentes à prova, deram cinco, seis, digamos, sete erros ortográficos, ficando nós sem saber se os erros foram equitativamente distribuídos por todos ou se houve alguns professores (digamos, um ou dois por cento) atrozmente açambarcadores que cometeram todos os erros, não deixando quase nada para os outros. Há professores declaradamente monopolistas no que se refere à ignorância. Pode ter sido este o caso…
Conheço bons professores de Mecânica, de Informática, de Economia, de Educação Física e de Educação Visual, esforçados, honestos, trabalhadores e empenhados (também no sentido financeiro, claro, visto que o salário há muito deixou de cobrir as despesas básicas dos seus tugúrios), que dão erros ortográficos ou de sintaxe, que é ainda pior, mas as roldanas continuam úteis, o Excel continua inflexível, o Euro continua atlético, a bola continua redonda e o sol continua amarelo.
Na verdade, não embarco facilmente nessa jangada de desmiolados que acham que todos os professores são, antes de mais, professores de Português. Será como afirmar que eu, antes de mais nada, sou professor de Matemática ou de Boas Maneiras, ou de Cidadania, ou de Educação Sexual em Meio Escolar. Não posso negar que, de um modo geral, em Portugal, a comunicação pedagógico-didáctica se faz com base na língua portuguesa, mas a comunicação raramente é perfeita sob o ponto de vista estritamente estrutural. Um professor de Matemática tem que saber o teorema de Thales; um professor de Boas Maneiras tem que ser muito bom em salamaleques e gestos amaneirados; um professor de Cidadania tem que ser bom em organização de eventos e um professor de Educação Sexual tem que saber o que é uma chuva de prata, mas um dislate gramatical, vez por outra, não traz grande mal ao mundo educacional, em nenhuma parte do mundo.
Quase 100 por cento dos nossos jornalistas, políticos, economistas, comerciantes e mangas de alpaca dizem “eu fui um dos que tive melhores notas”, em vez de dizerem “eu fui um dos que tiveram melhores notas”. Uma vez ouvi o Crato dizer uma destas na televisão e, generosamente, desculpei-o, porque ele não é professor de Português. Mas olhem que uma frase destas vale bem 200 erros num texto de 300 palavras. Oh se vale…